Como o uso de estatísticas ajudou a Alemanha a ganhar a Copa do Mundo 2014
A Bundesliga é o campeonato de futebol com maior média do mundo. Isso provavelmente você já sabe. O que talvez você não saiba é que isso não caiu do céu: é reflexo de muito trabalho. Trabalho este que, da mesma forma que muitas coisas na vida, começa depois de uma queda dolorosa. A maioria dos estudiosos de futebol aponta a eliminação do Nationalelf na fase de grupos da Euro 2000 como o paradigma de reestruturação do futebol alemão – mesmo que a equipe tenha sido vice-campeã na Copa de 2002, aquela campanha acaba sendo um ponto fora da curva.
A partir daquele ponto uma profunda reestruturação foi organizada pela federação alemã de forma a: a) buscar novos talentos e b) trazer diligência na forma com a qual os clubes administravam seus patrimônios. O resultado é o que você viu nos campos brasileiros em 2014 – o Tetra-Campeonato e uma geração fantástica de atletas, do goleiro Manuel Neuer ao reserva que faz o gol da vitória, Mario Götze.
Isso, claro, é o que vemos enquanto efeitos e causas “macro”. Existe um “trabalho de formiguinha” que fora feito de forma microscópica também. Trata-se de um uso pioneiro de estatísticas no futebol. É a chamada “Big Data”: uma absurda gama de estatísticas (médias e métricas totais) que são filtradas de modo a direcionar um treinamento ou uma preparação para um jogo em específico. Claro: em absoluto isso é inédito em esportes. Existem dados históricos que provam que apostas eram feitas nos gladiadores de Roma em função do histórico daqueles. Indo mais para frente no tempo, é bastante notório o uso de estatísticas antes de cada confronto em outros esportes. Sejam eles os coletivos ou os individuais. O estudioso do poker Leonardo Bueno lembra a questão da leitura no esporte das cartinhas: “Ler as pessoas, entender porque elas fizeram determinada jogada e traçar um mapa do oponente para no futuro prever como ele vai se comportar em uma das inúmeras situações que o jogo proporciona é de suma importância no Jogo. O jogador de poker que entende a psicologia do jogo com certeza está um passo a frente dos demais.”
Mas é talvez do beisebol que veio a maior lição para o futebol alemão na Copa de 2014. A análise de dados deve ser, lembremos, capaz de sumarizar o comportamento do oponente e do próprio time – e daí traçar previsões de comportamentos (dessas previsões é que os times podem fazer ajustes para buscar a vitória). Essa análise já é feita há quase 20 anos no beisebol – começou de maneira prática através do Oakland Athletics de 2001. Talvez você conheça a história, ela já foi documentada no filme Moneyball com Brad Pitt. Em suma, os A´s eram um time que “fornecia” talentos para os times mais ricos e nunca conseguia sair do lugar. Impossível esquecer uma das frases de Billy Beane no filme: “Se pensarmos como os Yankees aqui, perderemos para os Yankees lá fora”. Em suma, a equipe de Beane formulava uma análise coletiva com base em desempenho individual. Com isso, Oakland conseguiu descobrir e contratar os jogadores mais subestimados do beisebol naquele ano – o resultado foi uma ida aos Playoffs mesmo com 33% da folha salarial dos times mais ricos do esporte.
É exatamente nisso que o sistema alemão se baseou na campanha de 2014. Ciência. Matemática. Engenharia – quer coisa mais alemã que tudo isso? A racionalidade em si. Desenvolvida pela empresa alemã SAP, o HANA (High-Performance Analytic Appliance, foto acima) foi uma ferramenta bastante útil no campo de treinamento teutão da Bahia. O aplicativo era capaz de coletar terabytes e terabytes de dados – com o objetivo de determinar a movimentação dos jogadores, de onde os chutes eram dados, qual a frequência que um batedor de pênaltis escolhia o lado esquerdo ou direito. Isso tudo foi feito, além do software, com a ajuda de oito câmeras nos campos da Copa. Ao calcular a velocidade, posição e tempo de posse do jogador, o HANA deu um passo que Billy Beane não tinha no beisebol de 20 anos atrás: a automatização.
Informação é poder
Provavelmente você já chegou a uma conclusão: essa informação era passada para os jogadores em forma de instrução técnica. Era uma informação objetiva, não um “achismo” ou um “feeling”. Em entrevista para a ESPN americana às vésperas do 7 a 1 de Belo Horizonte, Oliver Bierhoff (foto abaixo) – ex-jogador e a versão germânica de Billy Beane em termos de hierarquia na comissão técnica alemã – ilustrou como o sistema funcionava. “Temos bastante dados qualitativos sobre os adversários”, disse.
E foi mais além. A vitória – ou melhor, goleada – da Alemanha ante Portugal na primeira fase do campeonato chocou o mundo. Poucos imaginariam que a seleção lusa ficaria pelo meio do caminho, ainda eliminada na fase de grupos – menos ainda que a equipe sofreria a derrota que teve ante o Nationalelf. A explicação pode estar em como Cristiano Ronaldo foi anulado pela defesa alemã. “Jérôme Boateng pediu para ver como Cristiano Ronaldo operava dentro da grande área”, disse Bierhoff na entrevista. Outro momento que a Big Data explica a campanha alemã é em referência à partida contra a França, discutivelmente uma das mais difíceis que os alemães enfrentariam na Copa. “Antes do jogo contra a França, vimos (através do HANA) que os franceses eram bastante concentrados no meio, mas deixavam espaços nos flancos, porque sua defesa não acompanhava”, ilustrou. “Então focamos nessa área”, concluiu Oliver, como você já deve ter imaginado.
A campanha alemã na Copa do Mundo de 2014 completou um ano. Mas o que ficará de seu legado é a ciência com a qual o Nationalelf dominou a competição – mostrando, em suma, que, embora o futebol seja o jogo dos gênios e do improviso, há bastante espaço para a racionalidade e o planejamento. Billy Beane não viu seu Moneyball campeão com Oakland ainda – mas deve estar bastante orgulhoso do resultado da Alemanha em 2014.
A partir daquele ponto uma profunda reestruturação foi organizada pela federação alemã de forma a: a) buscar novos talentos e b) trazer diligência na forma com a qual os clubes administravam seus patrimônios. O resultado é o que você viu nos campos brasileiros em 2014 – o Tetra-Campeonato e uma geração fantástica de atletas, do goleiro Manuel Neuer ao reserva que faz o gol da vitória, Mario Götze.
Isso, claro, é o que vemos enquanto efeitos e causas “macro”. Existe um “trabalho de formiguinha” que fora feito de forma microscópica também. Trata-se de um uso pioneiro de estatísticas no futebol. É a chamada “Big Data”: uma absurda gama de estatísticas (médias e métricas totais) que são filtradas de modo a direcionar um treinamento ou uma preparação para um jogo em específico. Claro: em absoluto isso é inédito em esportes. Existem dados históricos que provam que apostas eram feitas nos gladiadores de Roma em função do histórico daqueles. Indo mais para frente no tempo, é bastante notório o uso de estatísticas antes de cada confronto em outros esportes. Sejam eles os coletivos ou os individuais. O estudioso do poker Leonardo Bueno lembra a questão da leitura no esporte das cartinhas: “Ler as pessoas, entender porque elas fizeram determinada jogada e traçar um mapa do oponente para no futuro prever como ele vai se comportar em uma das inúmeras situações que o jogo proporciona é de suma importância no Jogo. O jogador de poker que entende a psicologia do jogo com certeza está um passo a frente dos demais.”
Mas é talvez do beisebol que veio a maior lição para o futebol alemão na Copa de 2014. A análise de dados deve ser, lembremos, capaz de sumarizar o comportamento do oponente e do próprio time – e daí traçar previsões de comportamentos (dessas previsões é que os times podem fazer ajustes para buscar a vitória). Essa análise já é feita há quase 20 anos no beisebol – começou de maneira prática através do Oakland Athletics de 2001. Talvez você conheça a história, ela já foi documentada no filme Moneyball com Brad Pitt. Em suma, os A´s eram um time que “fornecia” talentos para os times mais ricos e nunca conseguia sair do lugar. Impossível esquecer uma das frases de Billy Beane no filme: “Se pensarmos como os Yankees aqui, perderemos para os Yankees lá fora”. Em suma, a equipe de Beane formulava uma análise coletiva com base em desempenho individual. Com isso, Oakland conseguiu descobrir e contratar os jogadores mais subestimados do beisebol naquele ano – o resultado foi uma ida aos Playoffs mesmo com 33% da folha salarial dos times mais ricos do esporte.
É exatamente nisso que o sistema alemão se baseou na campanha de 2014. Ciência. Matemática. Engenharia – quer coisa mais alemã que tudo isso? A racionalidade em si. Desenvolvida pela empresa alemã SAP, o HANA (High-Performance Analytic Appliance, foto acima) foi uma ferramenta bastante útil no campo de treinamento teutão da Bahia. O aplicativo era capaz de coletar terabytes e terabytes de dados – com o objetivo de determinar a movimentação dos jogadores, de onde os chutes eram dados, qual a frequência que um batedor de pênaltis escolhia o lado esquerdo ou direito. Isso tudo foi feito, além do software, com a ajuda de oito câmeras nos campos da Copa. Ao calcular a velocidade, posição e tempo de posse do jogador, o HANA deu um passo que Billy Beane não tinha no beisebol de 20 anos atrás: a automatização.
Informação é poder
Provavelmente você já chegou a uma conclusão: essa informação era passada para os jogadores em forma de instrução técnica. Era uma informação objetiva, não um “achismo” ou um “feeling”. Em entrevista para a ESPN americana às vésperas do 7 a 1 de Belo Horizonte, Oliver Bierhoff (foto abaixo) – ex-jogador e a versão germânica de Billy Beane em termos de hierarquia na comissão técnica alemã – ilustrou como o sistema funcionava. “Temos bastante dados qualitativos sobre os adversários”, disse.
E foi mais além. A vitória – ou melhor, goleada – da Alemanha ante Portugal na primeira fase do campeonato chocou o mundo. Poucos imaginariam que a seleção lusa ficaria pelo meio do caminho, ainda eliminada na fase de grupos – menos ainda que a equipe sofreria a derrota que teve ante o Nationalelf. A explicação pode estar em como Cristiano Ronaldo foi anulado pela defesa alemã. “Jérôme Boateng pediu para ver como Cristiano Ronaldo operava dentro da grande área”, disse Bierhoff na entrevista. Outro momento que a Big Data explica a campanha alemã é em referência à partida contra a França, discutivelmente uma das mais difíceis que os alemães enfrentariam na Copa. “Antes do jogo contra a França, vimos (através do HANA) que os franceses eram bastante concentrados no meio, mas deixavam espaços nos flancos, porque sua defesa não acompanhava”, ilustrou. “Então focamos nessa área”, concluiu Oliver, como você já deve ter imaginado.
A campanha alemã na Copa do Mundo de 2014 completou um ano. Mas o que ficará de seu legado é a ciência com a qual o Nationalelf dominou a competição – mostrando, em suma, que, embora o futebol seja o jogo dos gênios e do improviso, há bastante espaço para a racionalidade e o planejamento. Billy Beane não viu seu Moneyball campeão com Oakland ainda – mas deve estar bastante orgulhoso do resultado da Alemanha em 2014.
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