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Vamos, MSV Duisburg! Minha experiência em um jogo da terceira divisão alemã

Por Vitor Rawet

A nossa querida e amada Bundesliga é exemplo para todo o mundo. Estádios cheios, torcida empurrando o time, jogos de alto nível e boa organização. Mas não é só de Borussia Dortmund e Bayern de Munique que vive o futebol alemão. Será que toda essa qualidade se manteria em um jogo mais regional, de divisões inferiores? Buscando essa resposta fui assistir um jogo da terceira divisão alemã.

O time escolhido foi o MSV Duisburg, da cidade homônima com população de pouco mais de 500 mil habitantes no oeste país. O motivo da escolha não poderia ser mais óbvio, já que moro aqui há dois anos e meio. Já tinha visto jogos dos dois Borussias em seus respectivos estádios, da seleção alemã na Veltnis Arena mas nesse último sábado finalmente fiz o que já deveria ter feito a tempos: ver o time da minha cidade jogando.


Antes de entrar na partida propriamente dita, vale contextualizar a importância do clube dentro do futebol alemão. O Duisburg tem uma grande tradição dentro da Alemanha. É um dos fundadores da Bundesliga e foi vice-campeão em sua primeira edição em 1963/64. Acumula 27 participações na primeira divisão sendo a última delas na temporada 2007/08. Ainda foi semifinalista da antiga Copa da UEFA (atual Liga Europa) em 79. Nos últimos tempos, porém, a realidade tem sido outra. Depois de disputar a segunda divisão em 2012/13 e ficar na 11a posição, foi forçosamente rebaixado ao terceiro escalão por estar extremamente endividado. Chegou a voltar na temporada passada, mas não resistiu e voltou para a terceira liga na atual edição.

Com a minha vivência na cidade, já pude perceber que os moradores abraçam o time. Não são poucas as janelas e varandas em que se vê a bandeira azul e branca tremulando. Adesivos com a Zebra, o mascote do time, estão presentes em muitos carros também. Em dias de jogos, é normal muita gente estar vestida com a camisa da equipe e a estação central da cidade está cheia de torcedores prontos para ir ao estádio. O cenário se transforma.

O jogo não poderia ter uma circunstância melhor. Liderando o campeonato, se o Duisburg batesse o SF Lotte e o Magdeburg não vencesse o FSV Frankfurt, o time estaria de volta à segunda divisão. Talvez por isso eu tenha escolhido justamente esse jogo para ir. Conseguir os ingressos não foi difícil, já que o estádio não costuma lotar. Como moro perto do centro, fui ao centro de informações turísticas no dia anterior à partida e comprei sem problemas para mim e mais um amigo. Seria possível adquirir no estádio ou na internet também. Como somos estudantes, o preço ficou em "apenas" 9 euros (seria 12 o preço normal), o mais barato do estádio.

A partida teria início as 14h. Como o estádio não fica afastado do centro da cidade, saí de casa uma hora antes do apito inicial, fui andando peguei o ônibus na estação central. Além dos ônibus regulares já chegarem no estádio, em dias de jogos há ainda alguns ônibus extras exclusivos para os torcedores que vão acompanhar o time. Logo no transporte o clima de jogo já foi percebido. Os cantos e gritos de guerra do time já eram entoados a plenos pulmões pelos fãs mais exaltados. Depois de cerca de 15 minutos, eu já estava nos arredores da bela MSV arena. Após de uma inesperada fila de uns 10 minutos e da passagem pelos seguranças, eu finalmente estava dentro do estádio.

Logo pude ver que apesar de ser um time de terceira divisão, o estádio com capacidade para 31.500 pessoas é bem moderno. Telão, placar eletrônico, cadeiras bem cuidadas em todos os locais e cobertura que abrange toda arquibancada. Pena que com um público de quase 18 mil torcedores, apenas metade do estádio estava ocupado. Mas faz parte da realidade da terceira divisão, contando também que a capacidade do estádio supera até mesmo estádios da Bundesliga principal.

O meu ingresso (e eu fiz que questão que assim fosse) era para os chamados Stehplätzen, ou seja, aqueles locais em que não há cadeiras e os torcedores ficam em pé durante toda a partida. Esse modelo é seguido em toda a Alemanha, com uma parte onde a torcida senta e outra em que se assiste o jogo em pé. Foi aí que vi o primeiro sinal que mesmo em um estádio padrão FIFA, o "futebol raiz" resiste. Isso sem tirar a possibilidade de quem prefira ver o jogo mais confortavelmente, assim o faça.

Antes do início da partida, a maioria dos Stehplätzen já estava ocupada por torcedores, sobrando para mim lugares na escada. Se o estádio não estava lotado, aquele setor estava e percebi que a minha visão do campo não seria completa, já que sou baixinho e tinha algumas cabeças na minha frente. Mas e daí? Eu não estava lá pra ver o jogo e bater palminha, estava lá pra cantar e empurrar o MSV pra vitória junto com os outros fãs do time. E assim foi o jogo inteiro.

Quando o time entrou em campo, o hino do clube foi tocado pelo sistema de som do estádio e os torcedores cantaram junto. Taí algo que eu pessoalmente não gosto. Prefiro ver as músicas cantadas somente a plenos pulmões. Mas isso já faz parte da cultura européia. A escalação também foi anunciada com a ajuda do "animador". Pelo menos foi só pra isso. Depois, foi cantoria e incentivo sem cessar, com a voz da torcida só sendo ajudada pelo batuque dos instrumentos.  Além disso, inúmeras bandeiras tremularam sem nenhum problema, ao contrário da realidade de vários estádios brasileiros.

Outro ponto que me agradou bastante foi a presença maciça de mulheres na torcida, mesmo entre os torcedores ultras. Cantavam, incentivavam e assistiam ao jogo sem ser importunadas por olhares ou mesmo cantadas maliciosas, como já presenciei várias vezes no Brasil. Além disso, o uso indiscriminado de celulares também não aconteceu. Foram raras as selfies. As vezes em que os torcedores pegavam os seus telefones era só pra acompanhar os outros resultados.

Assim que o jogo começou, um alemão que, digamos assim, já estava alegre por conta da cerveja, começou a conversar comigo e com meu amigo. Quando falei que era brasileiro, veio um sorriso e o relato de que já esteve em Porto Alegre. Até mesmo um pouco da rivalidade Gre-Nal ele conhecia. A simpatia foi tanta que ganhei uma cerveja do rapaz. Quis pagar mas ele não deixou.

Enquanto bebia minha cerveja com gosto, tentava pegar as músicas cantadas pela torcida. Com meu alemão limitado, conseguia cantar muitas das músicas: pedindo pra sair um gol, pra lutar e subir para a segunda divisão, pra torcida cantar o tempo inteiro. Nenhum cântico homofóbico ou machista, como é tão comum em outros lugares. Eu pulava e incentivava a todo momento, sem parar. O Duisburg era melhor na partida, apesar de sofrer alguns contra-ataques. Mesmo assim, nada de gols nos primeiros 45 minutos.

No intervalo, apesar de estar com fome, preferi não sair do lugar onde estava e comprar a tradicional Bratwurst, a salsicha alemã, porque poderia perder o meu lugar no meio da escada. Ainda bem que fiz isso, porque foi mais fácil de ver o segundo tempo.

Na etapa complementar, se o incentivo da torcida manteve o mesmo nível, o mesmo não se pode dizer do time em campo. O Duisburg sofre para chegar ao gol adversário, enquanto começa a tomar um pressão do Lotte. O nosso goleiro faz duas defesas difíceis que mantém o placar zerado. Logo, o placar eletrônico anunciou que o Magdeburg abrira a contagem contra o FSV Frankfurt, o que significava que não subiríamos nessa rodada. Bom foi que isso durou pouco, porque logo o Frankfurt empatou, fazendo o Duisburg depender de uma simples vitória. O estádio foi à loucura. O que já estava animado, ficou mais ainda.

Pena que em um rápido contra-ataque, o Lotte conseguiu abrir o placar, deixando a torcida calada e nervosa por um momento. Ainda restavam 20 minutos de partida e obviamente o Duisburg foi pra cima, abusando principalmente da tentativa de jogadas aéreas, mas sem qualquer chance real de gol. Os torcedores ainda acreditavam e não paravam de cantar. Veio a recompensa. No último minuto de jogo, em mais um cruzamento na área, o centroavante do time colocou a bola na rede. 1x1. "Chuva de cerveja", comemoração e alegria na torcida. Depois disso, não havia tempo para mais nada. Fim de jogo. O acesso ainda está nas mãos, já que um empate nos últimos dois jogos praticamente coloca o Duisburg de volta à segunda Bundesliga.

Embora lamentando os dois pontos perdidos, a torcida aplaudiu os seus jogadores, quando estes vieram agradecer o apoio dado durante os 90 minutos. Dá pra dizer que o empate foi com gosto de vitória, pelo gol marcado no final. A saída do estádio foi tranquila e rápida. Ainda deu tempo de ver um princípio de confusão entre dois torcedores, mas logo neutralizado pela "turma do deixa disso".

Em mais 20 minutos no ônibus eu estava de volta ao centro da cidade, já pensando na próxima vez que irei ao estádio. Foi demais! Pude ver que apesar de ser um jogo da terceira divisão e o estádio não estar lotado, o futebol ainda respira, com torcida em pé cantando o tempo inteiro. Isso tudo com organização e estádio moderno. Que continue assim!

Confira o vídeo da torcida:

2 comentários:

  1. Que excepcional matéria!!! Totalmente humana e linda crônica!

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  2. Amei essa matéria ! Meu sonho seria ver o Bayern na Alianz Arena !

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